segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

BERNHARD HÄRING: a lei mata, o espírito vivifica


                                  EXISTE SAÍDA?


                                                    (RESPOSTA AO PROFESSOR HÄRING)

NB: ESCREVI ESTA INTRODUÇÃO A UM ARTIGO BEM MAIS AMPLO HÁ 13 ANOS ATRÁS. - SERVE DE MEDITAÇÃO NOS DIAS DE HOJE. 

                                                                   INTRODUÇÃO

Estudei teologia moral nos idos anos de 1967-68 pelo manual A LEI DE CRISTO, do professor Bernhard Häring, uma obra ímpar que deixou todos os estudantes de Teologia Moral entusiasmados e ajudou alguns colegas a ganhar coragem para salvar seu povo da lei que mata e elevá-los ao espírito da lei que vivifica.

Trinta e quatro anos depois, chega-me às mãos, já após a sua morte, o seguinte lamento do meu magnífico professor:

A presente situação exige de mim como professor emérito de teologia moral, depois de 50 anos de ensino e ministério pastoral, que diga a minha palavra de alento, a última talvez, de simpatia para com os separados, mas também de simpatia para com os bispos e quantos atuam em tarefas pastorais. Talvez essa palavra de encorajamento e simpatia faça parte de minha preparação imediata para a morte, com a firme confiança na promessa do Senhor: Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia1


Confesso que fiquei extremamente sensibilizado e acordei de um sonho que durante os meus vinte e sete anos de juiz do Tribunal Eclesiástico Regional do Rio de Janeiro, desde a sua criação como Tribunal Regional (1975), embora com muitos e estranhos pesadelos provocados propositalmente por outro ilustre professor e Vigário Judicial, o Cônego Edgar Franca, que tantas vezes me repetia:

- Preocupa-me saber que muitos fiéis desconhecem a existência dos Tribunais Eclesiásticos.

- Preocupa-me mais ainda o despreparo dos Tribunais para os receberem, os ouvirem e lhes fazerem justiça.

- Quantas vidas marginalizadas, sofridas ou mortas porque não Ihes abrimos as portas da justiça ou o fizemos tarde demais.

Trabalhei arduamente ao lado do Cônego Edgar Franca e de outros doutos Vigários Judiciais, como Mons. José Maria Tapajós, Pe. Mário Magaldi, Côn. Manuel Tenório, Mons. Crescenti, Pe. José Guimarães, Pe. Barra, Pe. Luís Madero e D. João Corso, mas minha preocupação fundamental era dinamizar a justiça através da informatização e automatização do Tribunal, pois estava, e continuo convencido, que justiça demorada é só meia justiça.

Agora vem o professor Häring renovar minha velha preocupação chorando à minha porta por tantos e tantos amigos, iguais a tantos outros amigos meus, que sofrem e são pessoas maravilhosas, apenas erraram na escolha:

São pessoas iguais a nós, que sofreram mais do que nós, e que certamente nos superam no vigor da sua fé, na capacidade de resistência à dor, e no amor a uma Igreja que, por vezes, não parece compreendê-los.3

Mas o que mais mexeu com a minha sensibilidade foi o desafio que ele me fez, e a todos os canonistas, de modo especial aos Bispos Canonistas, de mostrar sabedoria e o verdadeiro rosto:

Diante do número cada vez maior de separações matrimoniais e do sofrimento inexprimível dos que passam por esta situação, a Igreja é chamada a mostrar a sua sabedoria e o seu verdadeiro rosto. 4

Sim, o desafio foi-me feito de modo direto porque a minha Igreja não é feita de corações de pedra, mas de homens de coração de carne. E eu sou um deles.














1-  HÃRING, BERNHARD, Existe Saída? - Para uma Pastoral dos Divorciados, pág. 12. Edições Loyola, 2'.edição, São Paulo, Brasil  1995                        

2. Conf. VASCONCELOS, ABÍLIO, Por que casou? Casou por quê? pág. 3. Livraria Nossa Senhora da Paz, Rio de Janeiro, Brasil

3. HÄRING, BERNHARD, Existe Saída? - Para uma Pastoral dos Divorciados, pág. 11. Edições Loyola, 2'. edição, São Paulo, Brasil, 1995.

4. HÁRING, BERNHARD, Existe Saída? - Para uma Pastoral dos Divorciados, pág. 10. Edições Loyola, 2'. edição, São Paulo, Brasil, 1995.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

PAPA FRANCISCO: é hora de Dedetizar a Igreja.

DEPOIS DO DISCURSO DO PAPA FRANCISCO

 À CÚRIA ROMANA

                                                        25 DE DEZEMBRO DE 2014

Antigamente eu me fazia valer do cânone 218 para fundamentar o meu direito, como professor, à liberdade de pesquisa e divulgação das minhas conclusões querem agradassem quer desagradassem.

Confesso, contudo, que nem o coração da CNBB consegui tocar para efetuar as mudanças necessárias. Do D. Eugênio Salles recebi uma repreensão porque quis mudar o texto litúrgico da missa para evitar um cacófato, dos mais nojentos, que se encontra nas orações de preparação das oferendas: ...”que agora (cagora) vos apresentamos” (primeiro o pão, depois o vinho). Evita-se deslocando simplesmente o “agora” para o final: ...”que vos apresentamos agora”. Nada foi feito. Continua a mesma ignorância!

Outro texto que lutei para que mudassem, e também não consegui, está no ritual dos casamentos entre um batizado e um não batizado. Diz ali o “Rito Sacramental do Matrimônio” (pag. 64, Paulinas):

- Caros noivos, N. e N.,   ....”Já vos tendo consagrado pelo batismo (apenas um), vai enriquecer e fortalecer-vos agora com o sacramento do Matrimônio”... Ora, se um não é batizado, o casamento não será elevado a sacramento (conf. Cân. 1055, 1 e 2), a não ser que o pagão se venha a batizar. Um erro grosseiro deste calibre ainda não foi corrigido. Será que estão esperando que o Papa Francisco faça outro discurso?

Após ter tecido as considerações, já postadas neste Blog, um colega disse-me que elas só chegariam ao conhecimento do Papa Francisco, que eu sei que quer o “debate” no Sínodo da Família e não meros discursos que quem pouco conhece a vida familiar, se eu vestir a capa do Cardeal Kasper.

Espero não precisar chegar a tanto. O bem da família grita mais alto. As viúvas e viúvos “da praça de Maio” são aos milhares clamando aos céus por justiça; os “velhos do Restelo”, de que fala Camões nos Lusíadas, já foram sepultados na própria ignorância.

Há muito casamentos que não foram abençoados por Deus... e Deus continua não querendo uni-los porque eles não oferecem condições, ou um deles não quer.  Há que declará-los nulos.

E aí vem a incoerência de uns e o escândalo de outros. Incoerência de quem exige que o casamento civil se mantenha indissolúvel quando a Igreja o dissolveu, como acontece com a dispensa concedida em casos de inconsumação do casamento canônico que consta também como casamento civil. Os civilistas não nos entendem! Casamento civil e o casamento canônico obedecem a competências diversas. O homem religioso não presta contas somente à sua Igreja, também tem que prestar contas à sociedade civil. Não pode ficar casado com uma no civil e com outra no religioso. O casamento civil, registrado, existe. Não pode ser dissolvido por uma Dispensa Pontifícia nem anulado por uma sentença de um Tribunal Eclesiástico. O estado de solteiro, que consta na carteira de identidade, não é a igreja que determina ou dá fé.

E o escândalo? Eram casados na igreja e agora não são mais. Escândalo de quê? A maioria dos escândalos é proveniente da minha ignorância. Que conhecimento posso ter eu do que se passa na cabeça de cada um ou entre quatro paredes? Eu me escandalizo (verbo reflexivo) por imaginar o que, na maioria das vezes, não é o que eu penso. Há fiéis tão devotos que chegam a pedir satisfação ao juiz; até ao confessor: se ele absolveu ou não determinado penitente que, após a confissão foi comungar; há também padres tão zelosos que antes da comunhão chegam a dar o seguinte aviso: “Está no Código: quem estiver em pecado mortal não pode comungar”. O pessoal fica tão assustado, se está ou não está, que a maioria nem vai comungar. Conclusão, a maioria está em pecado mortal. Será que está mesmo? Uma afirmação dessas, momentos antes da distribuição da comunhão, é perigosa. As mulheres casadas podem aproveitar para confirmar o adultério do marido que passou a noite fora. Ou os homens.

Um dos pecados mais perniciosos à FAMÍLIA é a fofoca, muito bem apontada pelo Papa Francisco, que existe na Cúria Romana, nas Cúrias Diocesanas, nas Igrejas... e que acaba com muita família boa.  

O Papa Francisco quer “debate” ... e de certeza não é de “cardeais” ... mas de quem mais entende de FAMILIA... família de católicos latinos, de católicos orientais, famílias judias, famílias islâmicas... a todos o Criador falou e a todos assiste como Pai.

Acaba aqui minha colaboração ao “debate” no Sínodo das Famílias. Não vou vestir-me de “cardeal” para que os Cardeais debatam estes assuntos, que eles nunca viveram em família, mas que são comuns nos Tribunais Eclesiásticos espalhados pelo mundo. Falo deles “de palanque” porque convivo com esses problemas há quase 40 anos (faltam dias) como juiz do Tribunal Eclesiástico de uma das maiores cidades do mundo.

Se ninguém falar ... se nem as pedras falarem... a INTERNET falará de cima dos telhados.
                                                          FIM

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

SINODO e Viúvas de maridos VIVOS


                                AS VIÚVAS DE MARIDOS VIVOS


Trata a atual lei da Igreja latina, no cân. 1707, do processo de morte presumida. Em resumo, quando não existe um documento autêntico, civil ou eclesiástico, que comprove a morte de um dos cônjuges, somente a declaração da morte presumida dada por escrito pelo Bispo Diocesano torna livre do vínculo matrimonial o cônjuge sobrevivente, podendo casar-se novamente.

Para o Bispo dar essa declaração, precisa obter a certeza moral da probabilidade da morte ter acontecido. Essa certeza só poderá ser obtida através de um processo administrativo-investigativo, aberto a todos os meios de prova: testemunhal, documental (cartas, relatos de jornais, noticiários), fama, indícios e probabilidades...  

Conheci centenas de mulheres vestidas de preto a vida toda, sem saber sequer se o marido tinha morrido. Viajou e não escreveu mais. Pelo que me consta, nenhuma das minhas amigas teve conhecimento dessa possibilidade da “morte presumida”. Nessa altura, eu nada pode fazer porque também não tinha essa informação. Nem os padres lá do interior. Aliás, no interior, não havia conhecimento da existência nem sequer de tribunais eclesiásticos. Para quê tribunal se só se pode casar uma vez na vida?

Por favor, Sr.s Bispos reunidos no Sínodo da Família, tenham compaixão sobretudo das mulheres que estão há cinco, dez, quinze ou mais anos, à espera do marido que foi e não voltou!

- Foi para a guerra e não voltou;

- Emigrou para outro continente e não voltou;

- Viajou para a cidade grande à procura de emprego, de dias melhores para a família, e não deu mais notícia;

- Sumiu de casa e não voltou.

As probabilidades de ter morrido eram, e continuam sendo, muitas. Tem até mãe procurando filhos e não os encontram: sumiram.

Não há sentido lógico manter um casamento sem coabitação... e houve mulheres portuguesas que só coabitaram uma noite, uma semana, um mês...e vestiram de preto pelo resto da vida, pois seu marido, que partiu para a América à procura de “ficar rico”, nunca mais deu sinal de vida: uns morreram, outros não conseguiram dinheiro para voltar, outros aproveitaram para descartar a mulher que deixaram.

Essa mulheres acabaram ficando “mal faladas”... e, na impossibilidade de se desvincular do casamento e procurar vida melhor em outra união, amortalharam-se no luto.

O problema dessas famílias, de uma perna só, não acabou. É mais atual do que se pensa. Qual a saída? Há que encontrá-la de outra maneira mais justa.

Se existe quebra do vínculo matrimonial, e existe, por uma graça especial do Sumo Pontífice para os casamentos não consumados ou não elevados a sacramento, será que não se pode conceder a mesma graça no caso dos casamentos em que as pessoas casam mas não coabitam?

Ou por que não determinar um prazo máximo de espera pela prova de vida para ser concedido o benefício da morte presumida?

A paciência dos outros tem limites!.....

domingo, 14 de dezembro de 2014

OS IMPOTENTES TÊM DIREITO AO CASAMENTO


PÔR FIM AO IMPEDIMENTO DE IMPOTÊNCIA


O DIREITO AO CASAMENTO É UNIVERSAL. Todos têm direito ao casamento. Cristo chamou também os aleijados para o banquete. Mas ninguém pode ser forçado a casar. Casa quem quer e pode, se encontrar alguém que o queira e possa.

O casamento entre seres humanos não tem por finalidade sine qua non a geração dos filhos. Mas quem opta pelo casamento tem a obrigação de não os excluir se tiver condições físicas, psicológicas e materiais para os gerar e educar. Mas nenhuma obrigação tem quem nasceu impotente ou se acidentou. O impotente, como ser humano, não perde o direito ao casamento. Torna-se, sim, bem mais difícil encontrar quem o aceite em casamento sabendo das suas limitações.

A Igreja não tem o direito de impedir, mas a obrigação de esclarecer. Impedir não pode coincidir com proibir. Não se pode proibir ninguém de casar. Pode-se, sim, adiar o casamento até que se cumpra o que determina uma lei positiva que não se oponha à lei natural, como é o caso do impedimento de menores.

Não é verdade que quem não pode ter filhos, não pode casar. Se assim fora, todos os casamentos envolvendo mulheres acima dos 50 anos seriam inválidos por elas estarem impedidas. Também não é verdade que quem não pode ter relações sexuais não pode casar, porque o casamento tem uma conotação bem mais abrangente, mais nobre e mais espiritualizada. Os tempos modernos estão mostrando isso ao exagero! O casamento não pode ser visto como único subterfúgio dos que vivem juntos taparem a boca ao povo, obrigando a contrair casamentos pessoas em fim de vida ou que mal se arrastam.

O impotente sexual pode casar e, tal como os demais casamentos goza do fazer do direito, isto é, permanece válido até prova em contrário. Na hipótese de alguém casar com um impotente por engano, sem querer, pode dirigir a um Tribunal Eclesiástico e solicitar a declaração de nulidade pelos motivos já previstos no direito:

- Engano.... Consentiu em casar porque foi enganado(a)

- Erro de qualidade diretamente visada.... Quer ter filhos

- Incapacidade de cumprir os deveres assumidos no casamento.... Não abre mão do ius in corpus.

A competência da Igreja não chega a tanto: impedir que case quem tem o direito natural ao casamento. O direito positivo deve obedecer ao direito natural.

sábado, 13 de dezembro de 2014

DIVÓRCIO CIVIL acaba com a BIGAMIA




            A PARTE BOA DO DIVÓRCIO

ESCREVER DIREITO EM LINHAS TORTAS


O nosso povo costuma dizer que Deus escreve direito em linhas tortas. E é verdade. Faz até das pedras filhos de Abraão, se quiser! Por que não aprendemos com Ele a fazer o mesmo?

Recordo que muito se escreveu contra a implantação do divórcio no Brasil. A Constituição Brasileira determinava que o casamento era indissolúvel e ponto final. 

Na prática o que acontecia? Os Tribunais Eclesiásticos declaravam a nulidade dos casamentos com base nas leis canônicas, incluindo os casamentos civis realizados sem dispensa da forma canônica. Uma vez declarado nulo determinado casamento, as partes podiam contrair casamento religioso com quem quisessem... mas no civil, não. Pela lei civil o casamento continuava com validade. O ato jurídico do contrato de casamento continuava válido pela lei civil mas fora declarado inválido pela lei canônica  Uma situação inusitada: casado pela lei civil, solteiro pela lei canônica. E por que? Porque casaram validamente pela lei civil mas não pediram dispensa da forma de realizar o casamento.  Casos assim de “bigamia” eram constantes: casados no civil com uma pessoa e casados na igreja com uma outra. Como resolver? Veio o divórcio civil.

O divórcio é um mal? – É. Mas foi a falta de diálogo que o fez nascer assim.

Como todo o mal pode ser mitigado, também no divórcio encontramos coisa boa que deve ser aproveitada: a obrigação coercitiva de sustentar os filhos, e até a mãe ou pai deles,  se necessário for. A desobediência leva à prisão. É quase que o único descumprimento das leis brasileiras que leva os desobedientes à cadeia. Até o Romário, hoje Senador, já foi detido por não pagar a pensão do filho!

Na prática, quando um casamento é declarado nulo por um Tribunal Eclesiástico, e existem filhos a sustentar, de nada adianta o juiz eclesiástico determinar a pensão dos filhos. Exigir a declaração do divórcio civil antes de publicar a sentença canônica, é zelar para que aos filhos não falte o pão de cada dia e a educação a que têm direito. A ameaça do purgatório, ou do inferno, para os pais que não paguem a pensão dos filhos, é a mesma coisa que nada.

Outro problema, que aflige a maioria, é o da participação na comunhão. Não pode comungar quem está casado no civil?  Não pode comungar quem não recebeu o sacramento do matrimônio? Pode não existir nem sombra de pecado.

Temos gente maravilhosa casada no civil com uma pessoa e no religioso com outra. Uns são divorciados no civil, outros nem isso, pois para não passarem por “divorciados”, mesmo depois de obterem a declaração de nulidade canônica, continuam casados no bilhete de identidade: no civil com uma e na igreja com outra. São milhares nesta situação. Isto gera um mal-estar para toda a família.

O que poderão fazer os Bispos na Sínodo das Famílias? Claro que não será elogiar ou aprovar o divórcio, mas facilitar o trabalho diplomático do Vaticano a dialogar mais com as autoridades civis em prol do bem comum. O ideal seria que as leis civis reconhecessem as sentenças dos tribunais eclesiásticos quando declaram o casamento nulo e, em vez de concederem o divórcio, homologassem as sentenças dos Tribunais Eclesiásticos. Não será fácil, porque nem sempre é possível ver o contraditório onde há concordância das partes ou ausência da parte demandada; ou haver concordância de terminologia, a começar pela noção de anular um casamento existente e declarar nulo um casamento que de fato aconteceu.

Mostrar o argueiro nos olhos dos outros é a coisa mais fácil. Há que reconhecer que no passado exigimos muito dos outros mas fizemos pouco esforço para ajudar a concertar.

As leis civis podem melhorar? - Podem e devem. As leis canônicas podem melhorar? - Podem e devem.  E esta é a hora.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

CASAMENTO NA IGREJA no princípio não era assim


NO PRINCÍPIO NÃO ERA ASSIM


Para o bem da família, para que os filhos não sejam discriminados na igreja, e o pai ou a mãe (o que participa das missas) não fique somente olhando os que comungam - porque casados apenas no civil ou numa igreja não católica - os Bispos reunidos no Sínodo das Famílias devem tomar medidas objetivas que favoreça essas famílias, cientes de que hoje não há mais como contrair casamento na clandestinidade, razão que levou o Concílio de Trento e baixar o decreto Tametsi tornando obrigatória a forma canônica do casamento sob pena de nulidade.

A solução para milhares de católicos casados com não católicos, no civil ou noutras igrejas, está em voltar às origens. LÊ-SE NA CARTA A DIOGNETO:

- “Os cristãos não se distinguem dos outros homens nem por regiões, nem pela língua, nem pelos costumes... Casam-se como todos e geram filhos, mas não se livram dos recém-nascidos; têm em comum a mesa, mas não o leito; vivem na carne, mas não segundo a carne; moram na terra, mas têm a cidadania no céu; obedecem às leis constituídas, mas com a vida superam as próprias leis; amam a todos, mas por todos são perseguidos”.

“Casam-se como todos”!

Quanta preocupação com a forma canônica do casamento! Até parece que vale mais a forma do que uma família constituída de modo diverso!

Com muita frequência aparecem pessoas na igreja, que não comungam há dezenas de anos, porque casaram somente no civil, ou em igrejas não católicas. Estavam apaixonadas por pessoas que lhes puserem como condição sine qua non outra forma de casamento.  Quiseram, sim, casar um com o outro, constituir uma família; tiveram filhos, são fieis um ao outro; a parte católica frequenta a igreja católica, os filhos estudam catecismo na igreja católica... O que lhes faltou? – Uma simples dispensa da forma católica e, ou, dispensa de disparidade de culto.

Numa sociedade em que muitos nem dinheiro têm para comprar a roupa de casamento, numa sociedade em que muitos são emigrantes com dificuldade em se comunicarem ou vivem na clandestinidade, numa sociedade onde se misturam as mais diversas raças, onde até as igrejas cristãs se multiplicam do dia para a noite, os católicos precisam voltar a “casar-se como todos” e a família por eles constituída deve ser amplamente amparada, sem discriminações...O cônjuge católico, que mantem a fé, não pode ser considerado “pecador público”, quando “marido de uma só mulher”.

É bom lembrar que na igreja católica já existe:

- o casamento simples, entre um batizado e outro não-batizado;

- o casamento elevado a sacramento do matrimônio, entre dois legitimamente batizados.

Aos Bispos diocesanos deve ser dada ampla competência para sanar todas as irregularidades, quer pela convalidação simples, quer pela “sanatio in radice”. Estes devem aproveitar as visitas pastorais para fazê-lo. Essa é a função do pastor de almas.

Medite-se mais sobre alguns aspetos:

-No casamento é necessário que os dois queiram e os dois possam. Se um quer e pode, não é justo pagar a vida toda por aquele que não quer.

-A absolvição do confessor (foro interno) não pode ficar na dependência da sentença do juiz (foro externo).

- O fator primordial do casamento não é a forma como ele se celebra, mas a família a que ele dá origem.

- O sacramento do matrimônio é o segundo grau do casamento, um privilégio para dois batizados que vivem a fé e tiveram a sorte de se apaixonarem um pelo outro....

- O que constitui a família é o casamento, como consentimento mútuo de partes hábeis e livres...e os cristãos “casam-se como os outros”.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

ESPERA-SE MAIS que uma palavra de alento


                                ESPERA-SE DO SINODO DOS BISPOS

                              MAIS QUE UMA PALAVRA DE ALENTO


        Estudei teologia moral nos idos anos de 1967-68 pelo manual A LEI DE CRISTO, do professor Bernhard Häring, uma obra ímpar que deixou todos os estudantes de Teologia Moral entusiasmados e ajudou alguns colegas a ganhar coragem para salvar seu povo da lei que mata e elevá-los ao espírito da lei que vivifica.

        Trinta e quatro anos depois, chegou-me às mãos, já após a sua morte, o seguinte lamento desse  meu magnífico professor:
A presente situação exige de mim como professor emérito de teologia moral, depois de 50 anos de ensino e ministério pastoral, que diga a minha palavra de alento, a última talvez, de simpatia para com os separados, mas também de simpatia para com os bispos e quantos atuam em tarefas pastorais. Talvez essa palavra de encorajamento e simpatia faça parte de minha preparação imediata para a morte, com a firme confiança na promessa do Senhor: Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia (1)

Confesso que fiquei extremamente sensibilizado e acordei de um sonho que durante os meus vinte e sete anos (agora 39 anos) de juiz do Tribunal Eclesiástico Regional do Rio de Janeiro, desde a sua criação como Tribunal Regional (1975), embora com muitos e estranhos pesadelos provocados propositalmente por outro ilustre professor e Vigário Judicial, o Cônego Edgar Franca, que tantas vezes me repetia:

- Preocupa-me saber que muitos fiéis desconhecem a existência dos Tribunais Eclesiásticos.

                                       - Preocupa-me mais ainda o despreparo dos Tribunais para os receberem, os ouvirem e lhes fazerem justiça.

- Quantas vidas marginalizadas, sofridas ou mortas porque não Ilhes abrimos as portas da justiça ou o fizemos tarde demais. 2

Trabalhei arduamente ao lado do Cônego Edgar Franca e de outros doutos Vigários Judiciais, como Mons. José Maria Tapajós, Pe. Mário Magaldi, Côn. Manuel Tenório, Mons. Crescenti, Pe. José Guimarães, Pe. Barra, Pe. Luís Madero e D. João Corso, mas minha preocupação fundamental era dinamizar a justiça através da informatização e automatização do Tribunal, pois estava, e continuo convencido, que justiça demorada é só meia justiça.

Agora vem o professor Häring renovar minha velha preocupação chorando à minha porta por tantos e tantos amigos, iguais a tantos outros amigos meus, que sofrem e são pessoas maravilhosas, apenas erraram na escolha:

- São pessoas iguais a nós, que sofreram mais do que nós, e que certamente nos superam no vigor da sua fé, na capacidade de resistência à dor, e no amor a uma Igreja que, por vezes, não parece compreendê-los.3

Mas o que mais mexeu com a minha sensibilidade foi o desafio que ele fez, a mim e a todos os canonistas, de modo especial aos Bispos Canonistas, de mostrar sabedoria e o verdadeiro rosto:

- Diante do número cada vez maior de separações matrimoniais e do sofrimento inexprimível dos que passam por esta situação, a Igreja é chamada a mostrar a sua sabedoria e o seu verdadeiro rosto. 4)

Sim, o desafio foi-me feito de modo direto porque a minha Igreja não é feita de corações de pedra, mas de homens de coração de carne. E eu sou um deles. Grande parte dos casamentos realizados nas igrejas são inválidos. E quem casou invalidamente tem direito a contrair matrimônio válido, isto é, abençoado por Deus. Um dos sinais da bênção de Deus são os filhos do casal. Os confessores, melhor que os tribunais, podem ajudar a solucionar o problema dos casados na igreja e recasados no civil.

O prof. Häring gostaria de ter ouvido de um Papa o que o Papa Francisco escreveu recentemente: A igreja não pode ser uma Alfândega... a Comunhão Eucarística é um presente de Deus Pai para quem tem fé e precisa ...e não para quem merece. É por isso que todos dizem antes de comungar: Senhor eu não sou digno.
  Nas visitas pastorais muitos casamentos nulos podem ser "sanados" pelo próprio Bispo, ou declarados nulos por um tribunal itenerante ou "ad hoc" constituido.